terça-feira, 4 de junho de 2013

AS ESCOVAS E O AMOR

 
Tenho uma estranha mania – todas as vezes que compro uma escova nova, costumo nutrir a fantasia eletiva de que, dessa vez, ela não acumulará fios e mais fios. Nem preciso dizer que, nesse caso, a decepção é caminho implacável, não é mesmo?! Quase sempre é mais fácil comprar outra escova do que mudar a postura diante daquele objeto, promovendo os cuidados habituais que o mesmo requer. Todos nós temos a perfeita consciência de que, nova ou velha, qualquer escova, com o uso reiterado, pode chegar a aglomerar uma verdadeira peruca, mas gostamos de acreditar que, adquirindo um utensílio novo, resolveremos o problema daquela escova que apinhou mais que um punhado de fios. Grande erro!
 
Para que permaneça sempre limpa e adequada ao fim a que se destina, uma escova demanda de nós uma atitude ativa; exige que desaceleremos o nosso ritmo, reorganizando as mil prioridades da nossa rotina cada vez mais apressada e recheada de “necessidades individuais urgentes”. Assim, temos que, forçosamente, parar um pouco e apenas exercitar a paciência de remover fio a fio daquele emaranhado que vai se formando. Acontece que fazer isso uma única vez não soluciona a questão; a escova, inexoravelmente, voltará a colecionar as nossas madeixas. E é nesse momento que começamos a divisar o ponto crucial – enquanto não internalizarmos a convicção de que os cuidados devem acompanhar a frequência do uso, compraremos uma escova após outra, atacando o problema sempre na consequência, desprezando a causa.
 
Quando construímos novos hábitos, a visualização de determinados aspectos resta absolutamente evidente; acabamos por perceber na prática que, quanto mais demoramos a higienizar a escova, mais tortuoso é o momento da limpeza, posto que ela terá somado mais cabelo e mais sujeira. Percebemos, também, que remover os fios com habitualidade não faz com que não se acumulem, mas torna a tarefa bem mais simples e rápida, provocando uma verdadeira transformação na natureza daquele objeto – passa do bem descartável que desprezávamos ao bem durável que nos acompanhará por um longo tempo.
 
Com o Amor, funciona exatamente da mesma forma. Há pessoas que, por preguiça, por um senso extremado de individualismo, por altivez, por pressa, por receio, ou mesmo por egoísmo, diante da nossa realidade cada vez mais repleta de efemeridades, “pulam” conversas, adiam, de maneira vã, tentativas de consenso e encobrem conflitos. Muitas vezes, simples e breves diálogos poderiam ser bastante resolutivos, mas os seres teimam em evitá-los, criando, através dessas incoerentes convivências lacônicas, verdadeiros monstros relacionais, materializando obstáculos que eram pequenos e ficaram gigantes e intransponíveis pelo descaso.
 
Quando esses mesmos seres dão por si, a escova está bem ali, diante dos seus olhos, cheia de fios. A solução que lhes parece mais natural é sempre coincidente com o escapismo, num ensaio eterno de evitar o inevitável. Logo, jogam aquela escova e compram uma nova, acreditando que, dessa vez, não juntará mais cabelo. Seguem, assim, emendando relacionamentos, banalizando sentimentos e descartando pessoas, pois, ao surgir o conflito, afigura-se-lhes muito mais tentador livrar-se da situação supostamente importunadora do que ter a disposição afetiva de “se dar ao trabalho” de buscar a composição. Contudo, bem como nas escovas, os conflitos voltam a aparecer e os indivíduos voltam, por conseguinte, a descartar os outros.
 
Os descartes, todavia, não eliminam os conflitos, uma vez que os mesmos não tardarão a aparecer novamente. Consolida-se, então, a roda viva tão bem descrita na música Deixamos pra depois uma conversa amiga, que fosse para o bem, que fosse uma saí­da/ Deixamos pra depois a troca de carinho, deixamos que a rotina fosse nosso caminho/ Deixamos pra depois a busca de abrigo, deixamos de nos ver fazendo algum sentido/ Amanhã ou depois, tanto faz se depois for nunca mais...”. E ao olhar pra trás, após o transcorrer dos anos, essas pessoas se veem sozinhas, profundamente arrependidas de muitos dos descartes que fizeram, e, na maioria dos casos, essa reflexão ocorre quando já é tarde demais.
 
Por isso, cuidemos de nossas escovas, abandonemos os “universos exclusivos” e valorizemos os bens duráveis, pois a felicidade e a harmonia não comportam existências passivas; são, na verdade, prêmios conferidos somente aos que, de corpo e alma, entregam-se ao laudável propósito da dedicação continuada.




terça-feira, 7 de maio de 2013

FESTIVAL "VARILUX" DE CINEMA


E, por falar em "X da questão", enquanto o Eike chora por estar um pouquinho "menos bilionário", um casal de namorados da cidade maravilhosa tenta se entender ao telefone:

- Amor?

- Falaê, Vic!
- Pensei numa coisa legal, lindo, pra gente fazer nesse final de semana.
- Tá bom, Vic. Mas c pode falar rapidão? É que tô vendo o jogo aqui.
- Tá! Bê, que tal se a gente fosse ver um filminho no sábado? É que começou o Festival Varilux de Cinema e...
- Filho da p...!
- Bernardo, c tá louco? Foi comigo isso?
- Claro que não, né, Vic! São esses caras desse time que ficam dando mole pro adversário. Eu fico muito irado com isso. Mas o que c tava falando mesmo?
- Do cinema, Bê!
- Ah, no sábado? Formou, então. Tinha falado com uns moleques lá da facul que tem vários filmes sinistros passando. Tem "Homem de Ferro 3", "Em transe"... Qualquer um tá bom pra mim.  A gente pode combinar de ir ver esse negócio de óculos pra você outro dia. Aliás, seu grau mudou?
- Tutututututu...
- Victória? Hum... Deve ter se ligado que não dava pra perder os lances dos caras agora! Vou combinar com a molecada e, depois, dou a ideia do esquema nela. Partiu mengão!

Homens: seres complexos, brilhantes, imprevisíveis e interessantes... Só que não!

segunda-feira, 6 de maio de 2013

REHAB


Hoje pela manhã, tive uma recaída. Pois é... Sei que todos dirão que ter recaídas é algo relativamente comum durante o processo de recuperação. Mas dá muita raiva! Bate aquela sentimento de impotência diante do hábito e da imperiosa força das tendências. Mais do que isso: vem aquele arrependimento junto com a impressão de que demos mil passos para trás; dá “aquela coisa ruim” perto do diafragma que sinaliza quando o emocional já está sabotando o nosso físico. E eu estava até indo bem, sabe?! Pelas minhas contas superficiais, estava há incríveis vinte e três dias sem “me trair”. A terapia estava rendendo a experiência maravilhosa da fantástica viagem para dentro. Amigos e familiares permaneciam ali, o tempo todo do meu lado, entusiasmando minhas intenções, minha tímida vontade de seguir em frente! Confesso, no entanto, que é muito difícil. A abstinência certamente mereceria uma outra história ao lado da história – uma sensação corrosiva de aprisionamento aos terríveis, e velhos conhecidos, fluxos mentais de pensamentos reiterados pela necessidade de algo. Acho que aquilo de “ser gauche na vida”, Drummond escreveu pra mim! Mas não temo a culpa. Realmente, fui fraco e devo confessar minha derrapada (meu terapeuta sempre diz que isso representa importante passo para o êxito). Vítima do próprio vício, hoje pela manhã, tive uma recaída – mais uma vez, atendendo ao instinto, fui tentar ser bonzinho e acabei bancando o trouxa! Só digo uma coisa: esse vício de ser BESTA ainda vai acabar comigo.